Depois de quase dois meses investigando as causas da febre foi diagnosticada uma doença no coração do nosso filho.
Com essa dúvida na cabeça foi pedido um exame, a pesquisa por PCR do Citomegalovírus, que o laboratório daqui encaminhava para São Paulo e levava sete dias para ficar pronto. Nessa uma semana de espera meu filho teve febre diária, várias vezes ao dia, em que tínhamos que intercalar dipirona com paracetamol, banhos e compressas frias. Chegamos a dar dipirona a cada duas horas.
Após uma semana, numa tarde de quarta-feira, veio o resultado do PCR negativo. Voltávamos à estaca zero: febre persistente e sem diagnóstico. Na quinta-feira pela manhã retornamos com a Dra. Carla. Tínhamos todos os exames de sangue normais, radiografia de tórax e ultrasssom de abdomem também normais.
No entanto, ao final da consulta veio o primeiro susto: a médica solicitou com urgência a realização de um ecocardiograma e uma tomografia. “Ele deve estar com algum tumor. Vamos procurar onde”.
Confesso que até esse dia eu estava muito tranquila e sempre digo que a ignorância pode ser uma bênção! Imaginava que como todos os exames estavam normais, realmente o que ele tinha era uma virose e assim como as febres haviam começado do nada, também do nada iriam embora…
Mesmo assim, ainda na inocência de que deveria ser uma virose, afinal de contas ele estava alegre e não reclamava de dores, marquei os exames – para sexta de manhã o ecocardiograma e para a tarde a tomografia de abdomem total – e tive uma tranquila noite de sono.
Semanas depois fiquei sabendo que meu marido teve a pior noite de sua vida naquela quinta para sexta. Noite em claro, pensando em todos os tipos de tumores da criança que podem cursar com febre, como o linfoma ou tumores abdominais que poderiam aparecer na tomografia, como nefroblastoma. O primeiro seriam pelo menos seis meses de quimioterapia, o segundo necessitaria retirar o rim e talvez quimioterapia associada. Só para citar as duas hipóteses mais comuns.
Sexta-feira, dia 4 de junho, ao meio-dia estávamos na clínica para o ecocardiograma. A cardio-pediatra Adriana Bresolin mal colocou o aparelho em seu coração e já decretou: é Kawasaki! Perguntei para o meu marido se era grave e a resposta foi curta e devastadora: “é!” Já comecei a chorar…
Fui para o carro com o meu filho enquanto meu marido aguardava os procedimentos. Dali da sala de exames mesmo a cardio entrou em contato com a infecto e decidiram pelo internamento imediato.
Enquanto esperava cometi a besteira de procurar no “Dr Google” sobre a doença e a primeira notícia era: “O caso mais conhecido da Síndrome de Kawasaki é do filho de John Travolta que morreu aos 16 anos…”. Meu mundo desabou! Mais tarde soube que o garoto não havia recebido tratamento adequado por conta dos preceitos da Cientologia, religião que o ator segue.
A Doença de Kawasaki é causada por uma reação autoimune do organismo contra a musculatura dos vasos sanguíneos – vasculite. Ainda não se sabe o que desencadeia essa reação, provavelmente são gerados anticorpos a partir de uma infecção por Estafilococus ou Estreptococus, que são duas bactérias extremamente comuns em nossa pele. Esses anticorpos produzidos para “combater” essas bactérias acabam “combatendo” a parede de alguns vasos sanguíneos, fazendo reação inflamatória nesses locais.
Na forma clássica da doença o olho fica avermelhado, como na conjuntivite, a língua inchada e avermelhada, inchaço e vermelhão de pés e mãos com descamação das pontas dos dedos, manchas avermelhadas pelo corpo, linfonodos aumentados (ínguas) no pescoço, febre alta de 39 a 40 graus. No exame de sangue – hemograma – aparece aumento dos leucócitos, anemia e aumento das plaquetas. Nenhuma dessas alterações havia em meu filho.
Os aneurismas de coronária ocorrem em 25% dos casos e se não tratados levam à morte súbita e infarto. A Doença de Kawasaki é a maior causa de doença do coração adquirida na infância nos Estados Unidos e no Japão. Esses aneurismas foram as únicas alteração presentes em meu filho, mas quando presentes já fecham o diagnóstico de Kawasaki.
No Felipe a coronária esquerda estava com quase 4mm, sendo o normal 1mm, ou seja, poderia infartar a qualquer momento. Dilatações acima de 5mm nem sempre regridem com o tratamento.
Viemos pra casa, arrumamos uma mala e já partimos para o hospital onde ele deveria ficar por pelo menos 24 horas para receber imunoglobulina. Existem várias teorias de como funcionam as imunoglobulinas, mas ainda não se sabe ao certo: seria com se elas fizessem um “reset” no sistema imunológico e ele passa a não produzir os anticorpos contra os vasos sanguíneos.
Como ele sempre foi muito querido, as 24 horas se passaram com muita calma. Não se incomodou com o soro e divertiu-se com a atenção das enfermeiras e das visitas, que em sua maioria chegavam carregadas de presentes.
Antes da alta hospitalar a Dra. Adriana nos fez diversas recomendações: ele não deveria fazer atividades aeróbicas por muito tempo, como correr e pular em cama-elástica. Também teria que tomar aspirina diariamente pelo resto da vida para reduzir o risco do sangue coagular no aneurisma da coronária e fazer um infarto.
A irmã do meu marido tem uma cunhada que é cardiologista e na época trabalhava no Incor – Instituto do Coração de São Paulo. Imediatamente ela nos contatou e falou que deveríamos leva-lo com urgência para lá, explicando que havia uma cardiologista especialista em Kawasaki e também quais os procedimentos que deveriam ser feitos. Contamos que tudo estava sendo feito aqui e todos nós nos tranquilizamos, mas combinamos que o levaríamos na próxima semana.
Dia 11 de junho fizemos a pior viagem das nossas vidas! Quanta tensão!! Em São Paulo ele fez um novo ecocardiograma e felizmente já apresentou regressão de tamanho do aneurisma!! Ou seja, a imunoglobulina já tinha surtido efeito!
A médica Ana Maria T. deu as mesmas orientações que havíamos recebido aqui em Cascavel e mais uma vez nos tranquilizamos por ter a certeza de que nossa cidade realmente tem excelentes profissionais e serviços de ponta.
Desde então, a cada semestre repetimos o ecocardiograma e confesso que às vésperas e também na hora do exame eu fico em pânico! No último, realizado em dezembro de 2014, com a graça de Deus o aneurisma regrediu e as duas coronárias estão com a mesma medida! Aspirina diária por tempo indeterminado, mas vida normal!!!
Mesmo sabendo disso e que a doença não retorna, a cada febre ou manchinhas no corpo eu fico desesperada. Quando ele começa a espirrar ou a tossir, por exemplo, “comemoro” aliviada: é uma gripe!!! Risos…
Por isso agradeço sempre a Dra. Carla E. pela dedicação, responsabilidade e amor a sua profissão! Se não fosse por ela talvez tivéssemos perdido nosso menino!
Há pouco tempo ela me contou que acordou uma madrugada com uma espécie de aviso sobre o diagnóstico da doença. Tenho certeza que foi Deus que a iluminou! Obrigada meu Deus!!
Autora: Cris de Cascavel – PR
Link: http://an6.com.br/blogs/superminidicas/1496-quando-a-febre-%C3%A9-grave.html
O caso do meu filho é muito parecido mas depois de 3 anos não foi preciso tomar mais o AAS seu filho ainda toma? Mesmo com as artérias normais?